Descomissionamento
Recentemente, nos últimos anos, temos ouvido no âmbito da indústria de óleo e gás no Brasil a palavra “descomissionamento”. Trata-se de uma expressão que não costuma ter sua definição descrita em dicionários não especializados, não lexicais, o que leva muitas pessoas a achar tratar-se de um termo inexistente, um anglicismo ou um neologismo.
O significado da palavra “descomissionamento” na língua portuguesa indica a ação de descomissionar, de tirar a comissão de algo ou de alguém, por exemplo, retirar alguém de um cargo ou função temporária para o qual foi nomeado. Por extensão, também a ação de desmantelar ou de desativar alguma coisa.
Vejamos que, segundo definição consagrada da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), descomissionar significa tomar todas as providências necessárias para a desativação de uma instalação nuclear ao final de sua vida útil, observando-se todos os cuidados para proteger a saúde e a segurança dos trabalhadores e das pessoas em geral e, ao mesmo tempo, o meio ambiente.
A Vale anunciou, no início do ano de 2019, o seu plano de descomissionamento das barragens “a montante” ainda existentes e que se encontram já inativas, no sentido de eliminar as possibilidades de acidentes como os que ocorreram em Mariana e Brumadinho (ambas em Minas Gerias). Segundo a empresa, descomissionar significa deixar de ser barragens: serem esvaziadas e integradas ao meio ambiente.
O Dicionário do Petróleo (Eloi Fernández y Fernández, Oswaldo A. Pedrosa Junior, Antônio Correia de Pinho) define “descomissionamento” como a retirada de operação de um equipamento ou uma instalação.
A indústria petrolífera, notoriamente uma das mais importantes do mundo, também tem discutido e tratado do tema. Esta fase, que é muito mais do que um simples abandono, é atingida quando a extração de petróleo não é mais possível, seja por condições técnicas que impeçam o processo de produção ou pelo próprio esgotamento dos recursos, ou ainda por questões econômicas, quando os custos de produção são maiores do que a receita.
Quando um de seus ativos não mais produz o suficiente, precisa passar por um processo de desativação com procedimentos técnicos e legais, que vão além de simplesmente interromper a operação: é o descomissionamento. O descomissionamento é, portanto, o processo de desmantelamento de plantas de produção que não produzem o suficiente, com a remoção ou troca de seus equipamentos e instalações.
A grosso modo, é um processo de limpeza, remoção das estruturas e recuperação ambiental da área. Esta atividade vai ocorrer em qualquer local onde estiver instalada a estrutura advinda da exploração e da produção de petróleo, seja em terra (onshore) ou no mar (offshore).
O Brasil possui muitos ativos offshore em funcionamento, responsáveis pela maior parte da produção de petróleo e gás. Cada ativo, após certo tempo, atinge a fase final de produção, que é chamada de descomissionamento.
Muitas das plataformas fixas de petróleo no Brasil e no mundo estão atingindo o limite de sua vida útil de projeto. A perspectiva da Petrobras é de que, nos próximos cinco anos, sejam desativadas 18 de suas plataformas no Brasil, incluindo seus sistemas submarinos correspondentes.
Muitas plataformas ainda são economicamente viáveis, o que tem motivado as empresas a buscar metodologias capazes de estender sua utilização por um maior período de tempo.
Embora a principal atração brasileira no setor de óleo e gás seja o upstream, especialmente nas áreas de pré-sal, outras oportunidades interessantes descortinam-se no cenário nacional. Uma delas é o desmantelamento de estruturas de produção offshore, como plataformas fixas, FPSOs, sistemas submarinos, dutos e umbilicais e poços.
Considerando a fase incipiente da indústria de descomissionamento no Brasil, os esforços de colaboração entre operadores, representantes da indústria de serviços, universidades e governo são imperativos e podem ser benéficos para todas as partes envolvidas.
O descomissionamento de ativos offshore trata-se de um complexo empreendimento multi-disciplinar e representa um grande desafio para o Brasil.
São fundamentais para a atividade de descomissionamento, a regulamentação (ver adiante a Resolução nº 817 da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis - ANP), melhor relação custo/benefício envolvendo os meios navais, novas tecnologias e logística, acurada e precisa análise prévia de risco para o planejamento ambiental e planejamento financeiro.
A ANP considera que o descomissionamento das instalações ocorra quando estiverem esgotadas as alternativas para a máxima recuperação de hidrocarbonetos em um campo, ou que a vida útil das unidades não possa ser estendida em um ambiente de riscos operacionais e ambientais aceitáveis.
A ANP também menciona o objetivo do seu compromisso na elaboração de normativos que estabeleçam claramente os requisitos e critérios visando a execução das atividades de descomissionamento de forma segura, minimizando os riscos às pessoas, ao meio ambiente e aos demais usos.
Após complexa e longa discussão envolvendo a ANP, Marinha do Brasil, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Ministério Público e Petróleo Brasileiro S.A. - Petrobras, a ANP publicou em 27/04/2020 no DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, Edição 79, Seção 1, Página 37, a RESOLUÇÃO Nº 817, DE 24 DE ABRIL DE 2020, que dispõe sobre o descomissionamento de instalações de exploração e de produção de petróleo e gás natural, a inclusão de área terrestre sob contrato em processo de licitação, a alienação e a reversão de bens, o cumprimento de obrigações remanescentes, a devolução de área e dá outras providências.
Esta Resolução entrou em vigor em 4 de maio de 2020 (Artigo 67) e, naturalmente, na medida em que for sendo cumprida, será aperfeiçoada visando os melhores resultados para todas as partes envolvidas.
Para a RESOLUÇÃO Nº 817 da ANP >>> CLIQUE AQUI
A Resolução nº 817 prevê em seu Artigo 5º que as atividades de descomissionamento de instalações deverão ser executadas de forma segura, com o fim de mitigar os riscos à vida humana, ao meio ambiente e aos demais usuários, observando todas as normas pertinentes estabelecidas nesta Resolução e no seu Anexo I - Regulamento Técnico de Descomissionamento de Instalações de Exploração e de Produção. O Parágrafo único deste Artigo prevê que as atividades de descomissionamento deverão dispor de um sistema de gestão de responsabilidade social e sustentabilidade aderente às melhores práticas da indústria do petróleo, observando-se o disposto nos contratos para tal fim e, no que for pertinente, seguir as diretrizes para alcançar os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas.
De acordo com o Artigo 66 da Resolução nº 817, ficam revogadas:
I - a Resolução ANP nº 27, de 18 de outubro de 2006;
II - a Resolução ANP nº 28, de 18 de outubro de 2006;
III - a Resolução ANP nº 25, de 24 de abril de 2014;
IV - o item 51.5 do Regulamento Técnico de Dutos Terrestres para Movimentação de Petróleo, Derivados e Gás Natural (RTDT), constante no Anexo da Resolução ANP nº 6, de 3 de fevereiro de 2011, para instalações de produção de áreas sob contrato;
V - o item 26.4 do Regulamento Técnico do Sistema de Gerenciamento da Segurança Operacional de Sistemas Submarinos (SGSS), constante no Anexo da Resolução ANP nº 41, de 9 de outubro de 2015, para instalações de produção de áreas sob contrato; e
VI - os Artigos 25, 26 e 27 da Resolução ANP nº 52, de 2 de dezembro de 2015, para instalações de produção não integrantes da área sob contrato.
REGULAMENTO TÉCNICO DE DESCOMISSIONAMENTO DE INSTALAÇÕES DE EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO
VALE destacar No ANEXO I (a que se referem os Artigos 5º e 50 da Resolução ANP nº 817), o seguinte:
ANEXO I - REGULAMENTO TÉCNICO DE DESCOMISSIONAMENTO DE INSTALAÇÕES DE EXPLORAÇÃO E DE PRODUÇÃO
(OBJETIVO: estabelecer os requisitos e diretrizes para o descomissionamento de instalações em áreas sob contrato nas fases de exploração e de produção de petróleo e gás natural)
NO DESCOMISSIONAMENTO DE INSTALAÇÕES
1) As instalações retiradas de operação, os equipamentos necessários à execução do descomissionamento e a área onde as instalações estão inseridas deverão ser mantidos pelo contratado em condições de segurança, com o fim de mitigar os riscos à vida humana, ao meio ambiente e aos demais usuários, até que o descomissionamento seja finalizado;
2) O contratado deverá elaborar estudo de análise de riscos, que deverá contemplar todas as atividades previstas no descomissionamento de instalações;
3) As instalações deverão ser limpas e descontaminadas com o fim de mitigar os riscos à vida humana, ao meio ambiente e aos demais usuários da área, respeitando os normativos aplicáveis;
4) O contratado deverá assegurar o adequado gerenciamento de efluentes, resíduos e rejeitos gerados, respeitando os normativos aplicáveis;
OBS: o contratado deverá dispor de plano de gerenciamento adequado para tratamento e disposição de material radioativo de ocorrência natural (NORM), para a eventualidade de sua ocorrência na incrustação de dutos e outros equipamentos.
NO DESCOMISSIONAMENTO DE INSTALAÇÕES MARÍTIMAS
1) Quaisquer instalações deverão ser removidas da área sob contrato;
2) O alijamento de instalações no mar não será permitido;
3) A remoção parcial ou a permanência definitiva in situ de instalações poderão ser admitidas em caráter de exceção, desde que atendidos os requisitos normativos aplicáveis e devidamente justificada;
4) As propostas apresentadas para o descomissionamento de instalações marítimas deverão ser claras e devidamente fundamentadas, considerando a comparação de alternativas de descomissionamento, cujas análises devem adotar, no mínimo, os critérios técnico, ambiental, social, de segurança e econômico, considerando os seguintes aspectos:
a) técnico: avaliação da viabilidade técnica das alternativas considerando as características das instalações e as tecnologias existentes;
b) ambiental: avaliação dos riscos e dos impactos ambientais das alternativas nos ambientes marinho e terrestre;
c) social: avaliação dos impactos das alternativas às comunidades e aos demais usuários do mar e da perspectiva de variação dos postos de trabalho;
d) econômico: estimativa dos custos dos projetos das alternativas; e
e) de segurança: avaliação dos riscos das alternativas aos trabalhadores dos ambientes marítimo e terrestre, aos demais usuários do mar e a terceiros.
OBS: nenhum dos critérios, isoladamente, deverá ser considerado decisivo para a definição da alternativa.
5) As instalações parcialmente removidas ou que permanecerem in situ não deverão causar interferências injustificadas à navegação, ao ambiente marinho e aos demais usuários do mar;
6) O leito marinho deverá ser limpo de quaisquer materiais e resíduos não biogênicos, com qualquer uma de suas dimensões superiores a um metro, depositados no entorno das instalações após a conclusão do descomissionamento;
7) A realização de levantamentos hidrográficos específicos, após a conclusão do descomissionamento das instalações, poderá ser exigida, conforme disposto nas normas vigentes da Autoridade Marítima Brasileira.
VALe destacar No ANEXO III (a que se referem o inciso XX do art.2º e os arts.18, 22 e 30 da Resolução ANP nº 817), o seguinte:
DO ROTEIRO DO PROGRAMA DE DESCOMISSIONAMENTO DE INSTALAÇÕES MARÍTIMAS (PDI):
1) Quando o descomissionamento envolver uma unidade de produção, todas as instalações que a ela estiveram associadas também deverão ser contempladas no PDI;
2) As informações a serem apresentadas devem estar em acordo com aquelas constantes nos bancos de dados eletrônicos da ANP, tais como o Sistema de Informações Gerenciais de Exploração e Produção (SIGEP) e o Sistema do Poço ao Posto (DPP) ou supervenientes.
3) Além das diversas informações a serem apresentadas sobre os dutos tais como extensão total e a lâmina d'água dos trechos enterrados e aflorados, extensão dos trechos riser e flowline, profundidade estimada de enterramento, tipo de estrutura (rígido, flexível, polimérico ou híbrido), vãos livres, produto movimentado e a batimetria da origem e do destino, existem os aspectos de destaque (cruzamentos, interligações, interferências com linhas ativas etc) que vão influenciar o planejamento e execução física e orçamentária do descomissionamento. Será fundamental o arquivo de localização georreferenciada dos dutos, segundo o Padrão ANP 4C ou superveniente;
4) deverão ser apresentados registros fotográficos atualizados, mapas, dados e informações georreferenciados contendo a localização de todas as instalações de produção existentes na área onde estão inseridas as instalações a serem descomissionadas, destacando aquelas que são alvo do PDI;
DO PROJETO DE DESCOMISSIONAMENTO DE INSTALAÇÕES
1) atividades de içamento, corte, desmontagem, transporte de estruturas, mergulho, desconexão dos sistemas de ancoragem, despressurização, drenagem, limpeza e inertização;
2) embarcações a serem utilizadas e bases de apoio às atividades;
3) destinação final;
4) locais de armazenamento temporário e destinação final, quando aplicável;
5) no caso de dutos que serão assentados no leito marinho, mesmo que temporariamente, deverá ser apresentada proposta de rota de assentamento considerando informações sobre a caracterização dos meios físico e biótico do ambiente marinho.
6) estimativa de custos, conforme definido a seguir:
a) por instalação, para cada atividade prevista;
b) consolidada por macroatividades, tais como gerenciamento de projeto, abandono e arrasamento de poços, preparação das instalações para o descomissionamento, remoção de unidade de produção, remoção de linhas, remoção de demais estruturas do sistema submarino, destinação de materiais, resíduos e rejeitos, monitoramento, entre outros.
VALE destacar No ANEXO V (a que se refere o Artigo 34 da Resolução ANP nº 817), o seguinte:
1) Descrever as atividades de descomissionamento de instalações realizadas, especificando por tipologia de instalação, as unidades de produção, dutos, poços e demais sistemas, instalações, equipamentos, estruturas e obras civis;
2) Apresentar mapas, dados e informações georreferenciados das instalações removidas e das instalações que permaneceram in situ; os dados georreferenciados referentes às instalações removidas e às instalações que permanecerem in situ deverão ser apresentados em arquivos distintos, conforme o padrão ANP4C ou superveniente.
3) Justificar as diferenças significativas de custos e prazos entre o previsto no PDI e o realizado.
As normas em elaboração no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) visam o estreitamento do diálogo entre o Instituto e outros órgãos reguladores, como a ANP e a Marinha do Brasil, objetivando legislações ambientais específicas e consolidadas sobre descomissionamento, de forma que não haja impactos negativos ao ecossistema por conta de possíveis vazamentos de óleos e rejeitos tóxicos.
A perspectiva do Instituto sobre o descomissionamento das instalações de produção de petróleo offshore abrange os desafios a serem enfrentados pela indústria, por prestadores de serviços e instituições públicas para avaliar os fatores ambientais no processo.
Atualmente, o descomissionamento constitui-se num grande desafio para a indústria de produção de petróleo e gás natural. O entendimento e cumprimento da Resolução nº 817 da ANP, a ampliação da capacitação técnica e do desenvolvimento da cadeia de serviços com soluções específicas para o descomissionamento são questões relevantes.
O debate científico e a disseminação do conhecimento, são muito importantes para que os agentes oficiais, ANP, Governo do Estado do Rio de Janeiro e também outros Estados envolvidos, IBAMA, Marinha do Brasil, além da Petrobras e outros, promovam as melhores soluções práticas e factíveis. Este é um grande desafio.
Associada ao ciclo de vida das atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural, que inclui a fase de descomissionamento, também apresenta relevância a possível necessidade de recuperação de áreas onde possa se verificar a existência de passivos ambientais.
Nesse contexto, é de se esperar a atuação integrada das entidades oficiais como indutoras da implementação por parte dos Operadores das ações necessárias para o restabelecimento da qualidade ambiental das áreas utilizadas pela indústria.
Levando em consideração que a vida útil média dos projetos de extração de petróleo offshore é de 20 a 25 anos, mais da metade dos projetos já ultrapassavam 25 anos de operação em 2016, o que justifica estar, desde já, o descomissionamento na pauta das prioridades do Brasil.
Sendo o descomissionamento um complexo empreendimento multidisciplinar, a SAMOA WIPE SEA está preparada para assessorar as empresas interessadas em participar desta fase da indústria do petróleo no Brasil. A SAMOA WIPE SEA conta com um grupo de profissionais associados nas diversas disciplinas, tais como gerenciamento de projetos, regulação, planejamento ambiental, logística, topsides, meios navais, sistemas submarinos (dutos, umbilicais etc), sistemas de ancoragem, poços, georreferenciamento de instalações offshore, além dos delicados aspectos da fauna marinha (corais etc).
A observância à Conformidade, aos menores custos, aos parâmetros de integridade das instalações, aos requisitos dos órgãos reguladores e à efetividade dos resultados das partes envolvidas, são preponderantes na atuação da SAMOA WIPE SEA.